
Haddad afirmou nesta terça que Brasil ‘precisa muito da reforma, mais do que se imagina’. Proposta em análise não reduz carga tributária, mas reorganiza e simplifica cobrança. O relator da reforma tributária na Câmara dos Deputados, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), apresenta nesta terça-feira (6) os resultados de um relatório do grupo de trabalho formado na Câmara dos Deputados.
O parecer do grupo de trabalho, que contém as diretrizes da reforma tributária, representa um tipo de “prévia” sobre o substitutivo que deve ser apresentado ainda em junho pelo relator — a versão final que será votada pelos deputados.
Na prática, o grupo de trabalho não pode alterar o projeto de lei, apenas fazer sugestões. Ribeiro afirmou, no entanto, que esse trabalho vai agilizar a apresentação de um substitutivo (ou seja, uma nova versão do projeto) quando o texto for levado a plenário.
Em almoço na Frente Parlamentar do Comércio e Serviços (FCS) na última semana, Ribeiro explicou que, após a publicação do relatório do GT, o texto ainda deverá passar por alterações antes da apresentação do substitutivo.
“Vamos apresentar um texto ideal, e que a política vai a partir desse texto definir a quantidade dos votos que a gente precisa. Na Câmara, são 308, no Senado são 49. Essa quantidade é que vai determinar o que estará contido na reforma”, explicou o relator Aguinaldo Ribeiro.
Questionado nesta terça sobre o parecer do grupo de trabalho, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, declarou que acredita na aprovação da reforma tributária.
“Nós vamos aprovar. O Brasil precisa muito da reforma. Mais do que se imagina”, declarou Haddad a jornalistas. Segundo ele, o documento não deve ter muitas novidades em relação ao que vem sendo discutido. “O que tem é o desenho que apara as arestas para aprovar”, acrescentou.
‘Após o arcabouço, vamos focar nossas atenções em uma reforma tributária para todos’, diz Lira
Entenda
Atualmente, existem duas propostas sobre a reforma tributária em tramitação no Congresso Nacional, as PECs 45 e 110.
Imposto agregado, cobrado de uma vez só
Os textos, que servem de base para a elaboração do relatório e do substitutivo do relator, preveem a substituição de cinco tributos (IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS) por um ou dois Impostos sobre Valor Agregado (IVA).
Com a implementação do IVA, os tributos passariam a ser não cumulativos.
Isso significa que, ao longo da cadeia de produção, os impostos seriam pagos uma só vez por todos os participantes do processo.
Com o IVA, as empresas poderiam abater, no recolhimento do imposto, o valor pago anteriormente na cadeia produtiva. Só recolheriam o imposto incidente sobre o valor agregado ao produto final.
Cobrado no destino, e não na origem
Outra mudança é que o tributo sobre o consumo (IVA) seria cobrado no “destino”, ou seja, no local onde os produtos são consumidos, e não mais onde eles são produzidos.
Isso contribuiria para combater a chamada “guerra fiscal”, nome dado a disputa entre os estados para que empresas se instalem em seus territórios. Para isso, intensificam a concessão de benefícios fiscais.
Lira diz que vai pautar a reforma tributária, mas não garante votação neste semestre
Sem tributo em cima do próprio tributo
O futuro IVA, que substituirá os tributos atuais (PIS, Cofins, ICMS e ISS), incidirá somente sobre o preço do produto, sistema conhecido como “por fora”.
No sistema atual, com impostos cobrados “por dentro”, o ICMS estadual incide sobre o próprio ICMS e, também, sobre o PIS/Cofins.
Isso quer dizer que há impostos embutidos no preços servem de base para a cobrança outros tributos, o que dificulta o cálculo do imposto total está sendo pago nos produtos e serviços adquiridos.
Alíquota de 25% e imposto ‘dual’
Estimativas iniciais apontam para uma alíquota de 25% para o futuro Imposto Sobre Valor Agregado (IVA), a ser cobrado sobre o consumo no Brasil, seria uma das maiores do mundo. Os dados são da Tax Foundation. Esse ainda não seria o percentual definitivo a ser cobrado.
O coordenador do grupo de trabalho que discute a reforma tributária na Câmara, Reginaldo Lopes (PT-MG), afirmou na semana passada que existe “mais convergência” para adoção de um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) no modelo dual.
Na proposta do IVA dual, a previsão é a substituição de cinco tributos por dois impostos — um de competência federal, e outro com gestão compartilhada entre estados e municípios.
Valores mantidos no Simples Nacional
A reforma tributária em discussão no Legislativo vai manter os atuais valores para o Simples Nacional, de acordo com o Ministério da Fazenda.
Atualmente, o limite de faturamento para as empresas dentro do regime é de até R$ 4,8 milhões, o maior do mundo.
As empresas do Simples poderão, entretanto, optar pelo futuro imposto sobre valor agregado (IVA), a ser criado na reforma tributária.
Zona Franca de Manaus
A equipe econômica do presidente Luiz Inácio Lula da Silva também negocia a forma como serão mantidos os benefícios à Zona Franca da Manaus — promessa de governo que também está contida nas propostas de reforma tributária em análise pelo Congresso Nacional.
Desafios da reforma tributária: Zona Franca de Manaus
“Cashback” tributário
As propostas de reforma tributária sobre o consumo que tramitam no Congresso Nacional preveem um “cashback”, ou seja, uma devolução de parte do imposto pago, às famílias de baixa renda.
A ideia, com isso, é reduzir a chamada regressividade do sistema brasileiro, ou seja, o alto peso dos impostos para a população de baixa renda.
Setores ainda disputam exceções
Um ponto de atrito é a taxação dos setores da economia.
Aqueles que representam cerca de 70% do Produto Interno Bruto (PIB) veem risco de terem que pagar mais imposto se for aprovada a reforma tributária sobre o consumo.
Os textos em discussão, porém, preveem exceções para alguns setores, que teriam uma tributação menor. O relator Aguinaldo Ribeiro indicou que elas devem ser contempladas no relatório do GT.
Consumidor verá preço com e sem imposto
Se aprovada a reforma tributária, será possível saber exatamente qual o preço do produto sem imposto — o que será obrigatoriamente informado na nota fiscal da compra. E, consequentemente, o valor dos tributos será destacado.
Atualmente, a lei determina que as notas fiscais tragam, ao menos, um “valor aproximado dos tributos”. Mas não há certeza sobre o valor exato dos tributos por conta das dificuldades de cálculo.
Combate à sonegação
As propostas de reforma tributária em debate no Congresso Nacional fecham brechas existentes atualmente para a sonegação de impostos, além de reduzir custos e estimular os investimentos estrangeiros.
A avaliação é do secretário extraordinário da reforma tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy.
Tributação de jatinhos, iates e streaming
O relator da reforma tributária sobre o consumo, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-BA), indicou que deve propor a taxação de aeronaves e embarcações de luxo com o Imposto Sobre Veículos Automotores (IPVA).
No sistema atual, jatinhos e lanchas não pagam o tributo.
A reforma tributária sobre o consumo, que está sendo debatida no Congresso Nacional, também elevaria a tributação sobre serviços de streaming, mas reduziria sobre energia elétrica e sobre a conta do celular, informou o secretário extraordinário do Ministério da Fazenda para o assunto, Bernard Appy.
Fundo de desenvolvimento regional
Os estados e municípios começarão a negociar com o governo o valor do chamado fundo de desenvolvimento regional, que substituirá os benefícios fiscais concedidos atualmente (por meio de cortes de ICMS).
A primeira indicação é de que o valor pode começar em R$ 40 bilhões por ano, sem a participação da União, mas o ministro Haddad afirmou nesta terça que o governo federal vai aportar recursos. “Vai ter que entrar né”, declarou.
Reforma tributária
Discutido há décadas e muito aguardado pelo setor produtivo, o tema é considerado prioritário pelo governo para aproximar as regras brasileiras do resto do mundo e reformar um sistema que é tido como caótico por empresários e investidores.
Apesar de prioritária, a reforma é considerada complexa do ponto de vista político.
Diferentes governos tentaram, sem sucesso, fazer a reforma tributária nas últimas décadas, focados principalmente na tributação sobre o consumo.
As propostas esbarraram em resistências de caráter regional, partidário e de diferentes setores produtivos, todos representados no Congresso Nacional.
O principal objetivo da reforma é simplificar e facilitar a cobrança dos impostos. Essa medida é considerada fundamental para destravar a economia e impulsionar o crescimento do país e a geração de empregos.
Investidores reclamam do elevado número de tributos e da complexidade do sistema tributário brasileiro. Eles avaliam que isso afasta investimentos. No caso do ICMS estadual, por exemplo, há 27 diferentes legislações vigentes no país – uma para cada estado, incluindo o Distrito Federal. Com o IVA, haveria uma legislação única.
A disputa judicial entre Estado e contribuintes já soma R$ 5,4 trilhões (dados de 2021), montante que equivale a 75% do Produto Interno Bruto (PIB). Um dos objetivos da reforma tributária é reduzir, em consequência de regras mais simples, as disputas na justiça.
Analistas estimam que a reforma tributária sobre o consumo tem potencial para elevar o PIB potencial do Brasil em no mínimo 10% nas próximas décadas. Informações divulgadas pelo governo federal no projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024 mostram que o Executivo conta com a reforma tributária para ajudar no ajuste das contas públicas.